Transformação da Coisa
Curadoria: João Pedro Pedro
Abertura: 16/08/2025 | 16h às 20h
Período expositivo: 16/08/2025 a 06/09/2025 | 14h às 18h
Artistas:
João Paulo Paixão
Silvia Ruiz
Vitor Mazon

É com imenso prazer que o Alê Espaço de Arte anuncia a abertura da exposição Transformação da Coisa, selecionada através do Edital Ocupação 2025, cujo promove a diversidade e a liberdade nas artes visuais contemporâneas. Curada por João Pedro Pedro, a mostra traz o trabalho dos artistas João Paulo Paixão, Silvia Ruiz e Vitor Mazon.
Com base no livro A origem da obra de arte (Martin Heidegger, 1950) – no qual o filósofo elabora sobre a concepção de coisa, apetrecho e Obra –, a exposição Transformação da Coisa conecta os três artistas que, cada um à sua maneira, trabalham com o mesmo material, a mesma coisa: a madeira. Sem roteiro ou trajeto pré-estabelecido, a mostra te convida a um passeio não-linear por este “percurso visual desse destrinchamento de
ideias” (PEDRO, 2025).
Se considerarmos nas obras a sua pura realidade, sem nos deixarmos influenciar por nenhum preconceito, torna-se evidente que as obras estão presentes de modo tão natural como as demais coisas (HEIDEGGER, 2007, p. 10).
A abertura será realizada no sábado (16/08) das 16h às 20h no Alê Espaço de Arte.
Transformação da Coisa
“O caráter de coisa está tão incontornavelmente na obra de arte que devíamos até dizer antes o contrário: O monumento está na pedra, a escultura na madeira, o quadro na cor, etc.” Martin Heidegger, A Origem da Obra de Arte.
Em A Origem da Obra de Arte, o filósofo Martin Heidegger discute qual seria o princípio da Obra de Arte, onde surge e suas características. Com isso, abriu portas para a discussão do que é a Obra, sua função — ou a falta de —, e consequentemente para os caminhos da Arte Contemporânea, que não é somente a marcação do tempo em que vivemos, mas um conceito que se baseia na relação que a própria Obra estabelece com o espectador, de não apenas representar algo, mas fazer revelar — ou desvelar na linguagem do filósofo —, nos possibilitar perceber, aqui no sentido de vivenciar, as coisas.
No texto, somos apresentados à ideia de coisa e apetrecho.
A coisa é aquilo que existe por si mesma, independe de segundos ou terceiros para sua existência. Não precisa de mediação, não serve para nada — apenas é. A madeira, nesse sentido, é coisa: sua composição e presença já bastam para que ela se sustente em sua própria inteireza. A coisa possui a plenitude de ser, se impõe e se oferece ao mundo em sua forma mais pura, sem finalidade.
O apetrecho, por outro lado, é uma coisa tornada funcional. É a madeira que vira cadeira, ferramenta, utensílio — aquilo que passa a ser apenas enquanto em uso. O apetrecho depende de um fim prático, de uma serventia. Ao transformar a coisa em instrumento, o ser humano introduz um vínculo de dependência e direcionamento que a desvia de sua existência plena. O apetrecho se esvazia quando fora de seu propósito.
A Obra de Arte habita um entre-lugar. Deve buscar a “coisalidadade” da coisa, habitar plenamente em si mesma sem depender de contextos alheios ou de difícil acesso; porém também está inevitavelmente atrelada ao apetrecho, pois não se completa sem a ativação do outro. Ela instaura uma presença autônoma, que não depende nem do criador nem de uma função, e só se torna concreta neste encontro com o público. A Obra é, portanto, aquilo que nos permite olhar novamente para o que já estava ali, reconfigurando nossa percepção. É feita de matéria e, ao mesmo tempo, a refaz — dualidade que Heidegger denomina como Mundo e Terra. Mais do que representar, a Obra provoca, tensiona e atravessa. Ela não serve, ela se impõe e, nesta exposição, é a força que impera no espaço,
transformando a coisa e o apetrecho em experiência sensível, já que ela é a única que, sendo Obra de Arte, consegue permear outros campos sem se descaracterizar, sem deixar de ser.
Aqui estão reunidos três artistas que, de diferentes formas e conectados por uma única coisa, a madeira — ou melhor, a transformação dela —, conseguem abordar estes três conceitos em suas Obras. São apresentadas cadeiras, paisagens imaginárias feitas a partir de matrizes e composições não convencionais, árvores, retalhos, criaturas espinhentas e amorfas, todos para que — para aquele que ativamente experiencia uma exposição — uma avalanche dos três conceitos apresentados fundidos se deslize.
A exposição não possui roteiro ou trajeto, ela existe e coexiste, todas suas Obras estão e são. Não há linearidade e é desta forma que busca, não guiar, mas encaminhar o espectador para o percurso visual desse destrinchamento de ideias. Aqui — integralmente — não existem apetrechos e coisas, quem domina é a Obra de Arte, e ela está em todo o espaço.
Em Transformação da Coisa, o foco está nos modos como a matéria — em especial a madeira — é manipulada, recombinada e deslocada de sua função original. Procura-se ampliar a compreensão da Arte Contemporânea por meio de uma experiência visual que articula, em um recorte específico, sobre seus processos de transformação. A exposição reúne obras que evidenciam esses diferentes estágios: da matéria bruta à forma utilitária, e desta à construção artística. A curadoria parte desse eixo para organizar uma experiência em que a materialidade não é apenas parte compositiva dos trabalhos, mas ativa. Cada trabalho apresenta um modo próprio de lidar com a tensão entre coisa, apetrecho e Obra, sem buscar conclusões, mas criando um campo de relações visuais e estéticas que se sustenta na presença direta do espectador no espaço.
“Se considerarmos nas obras a sua pura realidade, sem nos deixarmos influenciar por nenhum preconceito, torna-se evidente que as obras estão presentes de modo tão natural como as demais coisas” (HEIDEGGER, 2007, p. 10).
Por fim, a sustentação da Arte Contemporânea, portanto, não recai unicamente sobre o artista, mas também sobre o olhar do público. É nesse encontro – entre coisa, apetrecho e Obra – que se dá a transformação da coisa: uma transfiguração do olhar, da matéria e da experiência.
João Pedro Pedro
Curador




















